Oração e bênção para a Matriz Africana





Aproximadamente cinco milhões de pessoas foram escravizadas na região da África que hoje compreende Angola, Congo, Moçambique, Benin, Guiné, Nigéria, Senegal; e trazidas para o Brasil. Aqui, os africanos foram marcados e deixaram sua marca, seja pela sua força de trabalho ou por todo conhecimento de suas culturas, saberes, tradições e valores civilizatórios. Nenhum outro lugar do mundo recebeu tantos escravos. Nossa comida, dança, música, o sincopado de nossos ritmos sobreviveram ao chicote e ao ferro graças à devoção ao sagrado, ao culto a nossa Matriz Africana. Matriz reverenciada no último sábado do ano, em pleno Pelourinho, local de suplício. O projeto Matriz Africana reuniu o Motumbá e o Samba do Vai Kem Ké para enterrar o ano de 2019 debaixo de muita música de matriz africana. E assim foi na noite do dia 27 de dezembro, no Largo Quincas Berro D'Água. Noite aberta pelo Samba do Vai Kem Ké, porque todo samba é uma espécie de oração, e encerrada pelo Motumbá, porque toda oração merece uma bênção.







Matriz significa o lugar onde algo é gerado ou criado. A cavidade pélvica das fêmeas, onde o embrião se desenvolve. Por isso a noite começou com um cortejo da Banda Didá pelas ruas do Pelourinho. Justiça para a primeira banda de percussão formada apenas por mulheres negras, e cujo objetivo é a educação de mulheres e crianças através da arte de Matriz Africana. Didá significa, em yorubá, o poder da criação. O nome foi escolhido pelo Maestro Neguinho do Samba, em 1993, por acreditar na criação como caminho de toda expressão artística. E o som dos tambores da Didá ecoou no casario colonial português, arregimentando locais e estrangeiros, na direção do Largo Quincas Berro D'Água.











O Samba do Vai Kem Ké é uma espécie de oração que se propõe à preservação e renovação do legítimo samba da Bahia.  Em seu terreiro, vale o culto à tradição do Samba de Roda, Samba Duro e do Samba Junino, que no ano passado foi reconhecido como o primeiro bem imaterial de Salvador. Criado pelo compositor, maestro e multi-instrumentista Augusto Conceição e o produtor e percussionista Lomanto Oliveira, o Samba do Vai Kem Ké é certeza de rodas de samba, de bater com a palma da mão, de sambar miudinho, de pés descalços e de girar o corpo até perder o juízo ou chegar à consciência. Uma catarse de músicas sagradas e consagradas do samba da Bahia, como Quixabeira, Paixão Antiga, Filho da Bahia, em meio às autorais como Varro o Tapete, Chapéu de Palha e a novíssima Leva o Carro.












Reverenciar a Matriz Africana é saudar a própria mãe; a Mãe das Águas e de todos os Orixás: Yemanjá. A Motumbá escolheu o Pelourinho para o lançamento da música Odoyá, antecipando o dia 2 de fevereiro. Tendo à frente o cantor, instrumentista e compositor Alexandre Guedes, a Motumbá é uma locomotiva de percussão e cordas, que pede benção mas não pede passagem, arrastando a todos em verdadeiro frenesi. Além de novas canções, sucessos como  Bororó, Pra Balançar de Novo, Na Mala, Meu Tambor, Jangadeiro, Parakundê, Sou do Malê, Pegada do Verão, Jererê e Batuque de Rua faziam pular a multidão aglomerada na Quincas. Foi quando Alexandre Guedes, já comandando o show do coreto do largo, abriu o mar de gente em dois criando uma passagem para o palco. É a Matriz Africana abrindo o caminho para 2020.












Ficha:
O quê: Projeto Matriz Africana
Quando: Sexta Feira (27 de dezembro), a partir das 19h
Onde: Largo Quincas Berro D'Água (Pelourinho)
Quanto: Entrada gratuita
A Matriz Africana faz parte da programação do Projeto Pelô da Bahia, que integra a estrutura do Centro de Culturas Populares e Identitárias (CCPI/Secretaria de Cultura do Estado da Bahia) na promoção da diversidade cultural, de forma acessível ou gratuita, nos espaços culturais do Pelourinho.

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